quarta-feira, 15 de março de 2017

Dor e seriedade II

Continuação do post anterior
Atitudes das pessoas perante a Primeira Guerra Mundial
Pouco tempo depois desses primeiros fatos da minha infância terem se passado, arrebentou a Guerra Mundial. Entendi mais ou menos o que era essa guerra, mas tinha a noção da distância enorme que havia entre o Brasil e a Europa. Portanto, era impossível que a guerra chegasse até aqui; enquanto a Europa passava por todo aquele sofrimento, no Brasil havia a boa vida tranquila e folgada; o Brasil não entraria em guerra, e por isso as pessoas aqui gostavam de celebrar a tranquilidade brasileira. Não só apreciavam isso os brasileiros, mas os estrangeiros oriundos de países que estavam na conflagração, mas que tinham vindo para o Brasil antes da guerra. Eles tinham pais, irmãos, filhos, netos, metidos na conflagração. Isso lhes interessava, mas, sobretudo, o que eles possuíam era um bem-estar de pessoalmente não participar da guerra.
Quando chegava a tardinha, era frequente verem-se nas ruas da São Paulinho rodas formadas na calçada por famílias de imigrantes. As donas de casa faziam pratos do tempo em que viviam em seus países de origem, os homens conversavam, davam risadas, as crianças brincavam, todos se preparando para comer e depois comendo valorosamente, comentando como era bom eles não estarem na guerra.

Comecei a observar isso e percebi que havia duas atitudes perante a conflagração: uma, a daqueles a quem era, sobretudo, agradável estar longe dela; a outra, a dos que admiravam a guerra, compreendiam sua beleza. Estes últimos não podiam ir à guerra porque tinham compromissos aqui no Brasil para manter a família; se eles fossem poderiam morrer, e a família ficava abandonada. Mas acompanhavam os jornais com o espírito de lutadores: seu país avançou ou recuou, os aliados deles avançaram ou recuaram, os meios de destruição se acentuaram. Aparece o aeroplano, então o grande perigo são os voos. Depois surgem os gases asfixiantes, os bombardeios em massa das grandes cidades. E no fim, coisa talvez pior do que tudo, as epidemias que contagiavam às vezes um país inteiro e que constituíam uma tristeza, uma coisa horrível.
Continua

Nenhum comentário:

Postar um comentário