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A calma e a glória
Ela possuía uma
gaveta na mesa de toilette dela, onde guardava papéis. Algum tempo antes de
morrer, vi que ela andava remexendo aquilo e rasgando muitos papéis. Uns dias
depois da morte dela, fomos verificar o que havia na gaveta, e vimos que ela
guardou o essencial; e que fizera aquilo para não termos trabalho com os papéis
dela, quando ela tivesse morrido.
Observei, então, que
ela mandou jogar fora coisas que eu teria gostado enormemente de conservar.
Mamãe fazia as contas da casa — era uma empresa que fornecia aos fregueses uma
espécie de notas, formando um caderno com todos os dias do ano —, e escrevia, a
cada dia, as despesas. Tudo isso ela jogou fora, pela preocupação de não dar
trabalho a ninguém. Vemos, assim, a serenidade no transpor a morte, com a
tendência ainda de dar com isso uma prova de amor e receber uma prova de amor, que
era o carinho dela até onde chegava. Mas na calma, vivendo a existência de
todos os dias.
De maneira que
quando ela adoeceu, foi uma coisa completamente inopinada. Ao cabo de dois,
três dias, estava morta.
Nesta fotografia se
nota, em nível modesto, doméstico, tanto quanto uma dona de casa pode ter, a
glória e a calma convivendo. A vida passou, mas ela está inteiramente tranquila
, com a sensação de que aguentou tudo.
E, depois, tão
afável, tão amável, tão pacífica… Mas há um pouquinho de glória do Céu que
recende aí. Não existe só esse sentimento terreno de que estou falando. Há
alguma coisa de celeste, que é incomparavelmente mais, e se exprimiria assim: a
Providência está protegendo-a, ela tem um misterioso sentir de que não vai
suceder também mais nada. Só acontecerá a morte, para a qual ela está
preparada. Deixe-a vir, já está tudo em ordem.
O Sinal da Cruz que
ela fez ao falecer indica bem isso. Ela se recostou, ergueu-se um pouco mais,
fez o “Nome do Padre” grande e caiu morta. É a calma e a glória no Céu, no
plano natural e no sobrenatural.
Continua
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