quinta-feira, 21 de julho de 2016

Respeito e afeto

Ensina-se um sofisma infame, afirmando que quanto mais respeitamos uma pessoa superior a nós, tanto mais devemos temê-la, porque ela a qualquer momento abusará de sua autoridade para nos impor algo dolorido e injusto. O convívio entre Dona Lucilia e Dr. Plinio, bem como o deste com seus discípulos, desfaz completamente esse sofisma.
As coisas inteiramente naturais, espontâneas, são por vezes difíceis de serem explicitadas. Quando as coisas não andam segundo a boa ordem da natureza, aparecem os problemas impondo-nos a necessidade de cogitar sobre eles e fazendo surgir, assim, as explicitações.
A naturalidade do filho com a mãe
Meu relacionamento com mamãe era tão espontâneo, tudo corria tão naturalmente e tão profundamente, que eu não tinha ideia de que pudesse existir algum problema. É um pouco como a respiração.
É uma coisa tão natural que não apresenta dificuldade. Assim também nas relações de mamãe comigo. Era a coisa mais natural do mundo que corresse de um modo excelentíssimo.
Certa ocasião, andando pela rua, torci o tornozelo e este imediatamente se inflamou muito, tornando-me qualquer passo extremamente difícil. E fui para casa de táxi.
Chegando lá, mandei procurar mamãe e mostrei para ela o que tinha acontecido. Ela preparou um emplastro e prendeu-o fortemente, imobilizando meu tornozelo.
Ela possuía, além de seu quarto de dormir, um quarto de toilette que servia ao mesmo tempo de sala de estar. Mamãe prezava muito esse lugar, porque em certas horas ela gostava de estar lá sozinha.
Depois de ela ter feito o emplastro, com toda a naturalidade arrastei-me do meu quarto e fui para o quarto de toilette dela, onde havia um sofá muito cômodo. Deitei-me no sofá e resolvi, sem consultá-la, o seguinte: “Eu vou passar um bom número de dias sem poder sair de casa. Ficar no meu quarto de dormir é muito cacete. Eu vou ficar aqui.” E implantei-me naquilo que se poderia chamar os domínios dela.
Nem me passou pela cabeça que fosse preciso pedir licença. Se aquilo fosse meu, eu teria agido exatamente como agi. A naturalidade com que ela tomou essa minha atitude foi espantosa também!

Quando o tratamento — que durou cerca de um mês de imobilidade — estava chegando ao fim, um parente disse-me, brincando: “Você não acha que está incomodando sua mãe aí?” Só então me veio a ideia de que minha presença pudesse incomodá-la, do contrário nem me viria à mente.
Continua

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