Dr.
Plinio chamava carinhosamente sua mãe por esse epíteto, pelo desejo dela de
tudo fazer com perfeição, “mamãe procurava fazer tudo do melhor modo que lhe
fosse possível, com cuidado e dedicação, seguindo o exemplo d’Aquele que disse:
sede perfeitos...” Vejamos as palavras de seu filho, Plinio Correa de Oliveira.
Como já tive ocasião
de comentar, mamãe manifestava constantemente uma certa tendência para o que há
de mais alto, belo e delicado. Assim, por exemplo, quando eu chegava da rua, à
noite, e ia cumprimentá-la, a encontrava junto à imagem do Sagrado Coração de
Jesus ou no seu quarto, esperando-me para uma “palavrinha”. Ora, no período de
tempo que antecedia a minha chegada, tendo ela terminado suas orações e
afazeres domésticos, no que mamãe pensava?
Elevação ao tratar de assuntos corriqueiros
Não saberia dizer com
exatidão, mas eu notava que o espírito dela se desprendia de altas regiões do
pensamento para me acolher e conversar comigo. Naquele colóquio, ficava-me uma
impressão semelhante à que teria uma pessoa a qual, após ter passeado no cimo
de uma montanha onde houvessem árvores floridas e perfumadas, descesse de lá e
percebesse que todos os seus trajes estavam impregnados do aroma daquelas flores.
Assim também eu tinha a sensação de que todo o espírito de mamãe ficava
embebido do perfume das coisas em que ela tinha pensado.
É preciso salientar
que eu não me apresentava para essas conversas com ela tendo alguma intenção
prévia . Minha disposição era a de ser o Plinio, seu filho, inteiramente
espontâneo, dizendo-lhe o que me apetecesse no momento. Ainda que se tratasse
de coisas insignificantes, qualquer fato corriqueiro do dia-a-dia que me
tivesse acontecido. E eu notava que mamãe procurava entrar naquele assunto
banal com a mesma elevação com que, até há pouco, dedicara suas cogitações a
temas mais altos . Ela imergia naquele pequeno episódio e como que o iluminava
com sua nobreza de espírito.
Então se interessava
pelo par de sapatos novos que eu tinha comprado, pelos meus trabalhos no
escritório, pela minha consulta ao dentista e por outros fatos de menor
importância que, no meu entender, deixavam de ser triviais pelo modo como ela
os considerava.
Esmero no escolher presentes para os filhos
O mesmo se poderia
dizer do modo pelo qual ela cuidava dos assuntos de casa, conferindo-lhes
aquela sua nota característica de bondade e delicadeza de alma.
Por exemplo, quando
preparava os presentes de Natal para os dois filhos, em geral brinquedos
comprados nas melhores lojas do gênero então existentes em São Paulo. Até
atingirmos certa idade, mamãe costumava pedir à nossa governanta, Fräulein
Mathilde, que nos levasse a essas lojas e nos fizesse escolher os nossos
brinquedos favoritos, dizendo-nos em seguida: “Agora rezem a São Nicolau, e
peçam a ele que lhes traga esses presentes”.
Claro, crianças que
éramos, acreditávamos naquela afetuosa combinação, e nos dirigíamos à loja de
brinquedos contentes e ansiosos, esperando que São Nicolau nos fosse favorável
. No dia de Natal, nossa alegria era completa ao vermos que tínhamos sido
atendidos…
Mas, além desses
presentes, mamãe se comprazia em confeccionar, ela mesma, outros brinquedos
para nós, especialmente para minha irmã, pelo fato de ser mais fácil elaborar
algo que agrade a uma menina. Lembro-me, por exemplo, de vê-la trabalhar num
enfeite para abajur que era uma espécie de guirlanda formada por figuras
femininas de mãos dadas, como se fossem várias meninas dançando ao som de uma
música em torno, digamos, de um chafariz.
Essas silhuetas eram
inspiradas em gravuras que mamãe colecionara de revistas brasileiras ou de
figurinos franceses. Depois de as recortar e colar, ela ainda as pintava com
purpurina, dando relevos dourados e outros adornos. Por fim, decorava o abajur
e dava de presente à filha. Aquilo lhe tomara tempo e empenho, às vezes até
altas horas da noite, mas era de admirar a perfeição e o cuidado com que mamãe
se entregava à tarefa. E, a meu ver, o melhor dessa perfeição estava no fato de
que, com o passar do tempo, as figuras perdiam aderência no abajur, se
descolavam, caíam, e o objeto tornava-se feio. Dona Lucilia então se desfazia
de tudo: “Acabou-se, não tem mais beleza, e a perfeição agora consiste em
pensar noutra coisa. Isso fica para o passado. Pensemos no futuro.”
Continua no próximo post
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