terça-feira, 8 de julho de 2014

Os pequenos gestos, reflexos de uma alta virtude

Envolvente e nobre, expressão de profunda delicadeza, presente às vezes até mesmo na dor, esplêndido complemento do olhar de Dª Lucilia era, sem dúvida, seu sorriso. Transparecendo nele a conexão das virtudes de que fala Santo Tomás de Aquino, era marcado, simultânea e discretamente, por uma tristeza cheia de resignação e por uma temperante alegria. Tristeza que com freqüência chegava ao extremo; alegria que poderia por vezes ser intensa.
As tênues e belas luzes do crepúsculo e da aurora estavam sempre unidas em seu sorriso. As alternâncias harmônicas deste contribuíam para o gracioso da fisionomia, que tão bem refletia o interior de uma alma preponderantemente voltada a fazer bem a todos.
Por mais que se tenha comentado esta qualidade de Dª Lucilia, nunca será o bastante louvá-la: era emocionante comprovar nela o carinhoso desejo de atender às necessidades alheias, mesmo aos 91 anos!
— Os senhores me permitem uma sugestão? Eu fiz muitas imprudências em minha vida, lendo e forçando a vista, em lugares pouco iluminados. E agora vejo os senhores neste hall de entrada, que não é próprio para leitura. Sempre que necessito me distrair folheando álbuns ou revistas, uso a sala de jantar, que tem muita luz, e como eu não vou mais retornar, os senhores poderiam passar para lá. Tenho certeza de que os senhores enxergarão melhor naquele ambiente.
Com estas palavras, Dª Lucilia aconselhava a dois jovens que liam — um, o jornal e o outro, um livro — enquanto aguardavam, no hall interno do “1º andar”, para serem atendidos por Dr. Plinio. Foi logo depois de a terem cumprimentado que ouviram esse oferecimento tão afável da parte dela.
Em seguida, Dª Lucilia foi conduzida pela empregada até seu quarto, deixando os dois jovens encantados. Comentaram a bela manifestação de bondade de que tinham sido objeto e retornaram às suas respectivas leituras.
Passado algum tempo volta a empregada, entreabre um pouco a porta do corredor que dá para o hall e lança um olhar aos visitantes. O fato se repetiu uma segunda vez, o que não puderam eles deixar de observar:
— O que estará acontecendo?!
Na terceira vez, a empregada, sorrindo, dirigiu-lhes a palavra:
— Os senhores não vão passar para a sala de jantar?
— Não! — disseram eles.
— Ah! Por favor, Dª Lucilia fica muito aflita sabendo que os senhores estão lendo nesta meia luz. Enquanto não mudarem de sala, ela não ficará sossegada.

Nessa pequena atitude de Dª Lucilia — que julgava um dever de consciência proteger a visão de dois jovens desconhecidos — transparecem, uma vez mais, as elevadas qualidades de uma bela alma.
(Transcrito, com adaptações, da obra “Dona Lucilia”, de Mons. João S. Clá Dias)

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