A serenidade e a segurança que tanto caracterizavam Dona Lucilia, e que
ela difundia tão prodigamente em torno de si, vinham-lhe de um tabernáculo
interior que os vagalhões da vida não conseguiram atingir.
Quando alguém recebe
um toque da graça vinda do Céu e sente uma espécie de glória que o cerca, o
ilumina, é envolvido de uma tranquilidade, uma serenidade esplêndida, uma
segurança magnífica e de um gáudio em que não entra em jogo a vidinha de todos
os dias, nem o “vidão” do dia da glória. É uma espécie de participação da honra
que Deus fará ao indivíduo quando ele entrar no Céu, que é uma coisa única!
Em todo homem há duas histórias: a interna e a externa
Todos nós, mais ou
menos, tivemos ocasião, numa circunstância ou noutra da vida, de experimentar
uma consolação especial na qual, entre outras coisas, sentimos todo o nosso ser
honrado, dignificado e elevado por esse contato com Deus. Perto disso, todas as
glórias terrestres de fato não são nada, não valem nada, não contam para nada.
Em geral, as pessoas com verdadeira vida interior têm em relação a esta vida
terrena uma posição assim: elas podem dizer que a vida não vale nada, em certo
sentido; vanitas vanitatum et omnia
vanitas1, ou “tudo é vaidade e aflição do espírito”2 — expressões
lindíssimas, aliás!
Entretanto, em outro
sentido, não é tanto assim. Por exemplo, Jó recebeu um prêmio na Terra que foi
o de ter muito mais depois da prova, do que a enormidade que ele recebera antes
dela. Ademais, viveu muitos anos e — coisa muito pouco moderna e por isso mesmo
muito verdadeira e bela — teve uma grande quantidade de filhos. Após perder
todos os filhos, ter uma grande quantidade de filhos era ainda uma grande
glória.
Esta vida, portanto,
tem o seu valor, e o verdadeiro católico compreende esse valor.
Mas há duas coisas
que se fundem e estão por cima disso. Uma é a história externa do indivíduo:
aconteceu isso, fez aquilo, etc. Outra é a história interna: aquilo por onde
ele passou de grande, de pequeno, de glorioso, de insignificante, toda a
história de sua alma, com as cicatrizes que o sofrimento deixou nela, e que
preparam esta pergunta: Em função do meu passado, como será o meu futuro, e
como terminará para mim esta vida?
É uma indagação
muito importante e que o homem cozinha sozinho consigo, porque ela é
incomunicável. É tão íntima, tão interna, que eu acho que a maior parte das
pessoas nem saberia como dizer para outro o que leva dentro de sua mente.
Continua...
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