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Compondo um padrão de católico
Compondo um padrão de católico
Santa Teresinha, numa de
suas cartas, afirma que seu tio Guérin era um verdadeiro santo. Muitas atitudes
dele, vistas fora do contexto, parecem um pouco duvidosas: ganhou de repente
uma alta soma de dinheiro, herdou um castelo, ficou meio metido a nobre, embora
fosse da pequena burguesia. Teve assim coisas discutíveis, não imorais; mas um
santo é muito mais do que um homem que apenas não é imoral! O tio Guérin parece
ter sido, o tempo inteiro, um homem íntegro. Mas parece-me muito mais provável
que o Sr. Martin, pai de Santa Teresinha, tenha sido santo. Mas a Igreja ainda
não se pronunciou2.
Percebe-se que Santa
Terezinha via no tio Guérin um analogado primário3. Portanto, uma pessoa pode
compor o seu analogado primário, e Dona Lucilia o compôs de acordo com aquele
gênero. A consideração sobre se as almas correspondiam ou não àquele padrão e
qual era o relacionamento que assim se estabelecia, foi o objeto da atenção
direta e primeira dela na época de sua infância, e durante algum tempo depois.
A isto se somou, de um
modo muito natural e orgânico, a Religião, porque se vê que aquele analogado
primário era construído segundo uma noção católica de homem, a qual por sua vez
se formava conforme uma ideia da Igreja Católica inteiramente exata e
verdadeira; ideia essa muito alimentada pelo que a Igreja ensina sobre a
santidade, enfim, a respeito de todas as virtudes cristãs.
Uma montanha atrás da qual se levanta o Sol
Para Dona Lucilia,
portanto, o grande homem da vida temporal era o pai dela, visto nessa
perspectiva.
Mas percebe-se que, a
partir daí, seu espírito elevou-se. E, de uma série de satisfações e decepções
na ordem pessoal, veio uma certa ideia geral sobre a vida, o conjunto dos
homens, o gênero humano, e uma ascensão muito maior, relativa à figura do
Sagrado Coração de Jesus, de toda a Religião católica, da piedade, de Nossa
Senhora, etc.
E nessa fase, partindo
de um ponto de vista moral, há elucubrações metafísicas e religiosas que
culminaram na figura do “Quadrinho”4, em cujo olhar se percebe tudo isso, mas
se nota também uma enorme e suave decepção, sem vingança nem amargura, sem
abandonar uma esperança que está no fundo e faz a alma reportar-se a muito mais
alto. No fim do processo, o material primeiro não ficou posto de lado, mas foi
ultrapassado, como por exemplo, uma montanha atrás da qual se vê levantar o
Sol: a primeira coisa que aparece é a montanha, depois se levanta o Sol, e a
montanha parece pequenininha porque o astro-rei está brilhando no horizonte.
Assim também, nesse
processo mental, primeiro surgem certos aspectos terrenos, os quais depois são
considerados pequenos porque algo maior apareceu.
Continua no próximo post.

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