Plinio Correa de Oliveira evoca um exemplo que marcou
profundamente sua formação: o convívio entre Dona Lucilia e seu esposo.
O fundamento do bom convívio está em que as pessoas se respeitem mutuamente.
Quando não se respeitam, o convívio não se mantém bom, acaba azedando. Mesmo
sendo tão novos, respeitem-se, e os senhores começarão a achar que os outros
são interessantes. Quando os senhores não se respeitam a si próprios e não
respeitam o outro, acabam desgastando aquela companhia e ficam fartos daquele
ambiente.
Um
ambiente austero, que não tem as pagodeiras imundas deste século, mas exige de
cada pessoa pensamento, reflexão, domínio sobre os defeitos de sua própria
natureza, castidade; esse ambiente se torna agradável na medida em que todos se
respeitem. Se começarem a brincadeira e os apelidos, o nível do ambiente acaba
abaixando; daí a pouco todos estão se achando cacetes, brigando uns com os
outros e, terceiro passo, começam a olhar para a porta de saída, com a ilusão
de que naquele mundo lá fora as pessoas se tratam melhor. Os senhores sabem que
não é verdade, mas as pessoas se iludem.
Lembro-me
de meu falecido pai e do relacionamento dele com minha mãe. Eu nunca os vi
brigarem, nem terem algo de parecido com uma briga. Ele a tratava normalmente
como todo o marido trata a esposa: você. Portanto, dizia para ela “Lucilia,
você”; e ela a ele “João Paulo, você”. Mas às vezes, quando entravam em desacordo
sobre um ponto qualquer, ele a tratava de senhora e afirmava: “Senhora, isto
não é assim.” Era o máximo do fogo. Resultado: a companhia entre eles e o trato
eram os mais calmos e os mais agradáveis que possam haver.
Às
vezes, eu chegava em casa e encontrava os dois velhinhos deixando escorrer o
tempo, à espera da morte que viria mais cedo ou mais tarde. Graças a Deus veio
tarde para ambos: ele morreu com oitenta e quatro anos e ela com noventa e
dois. Aquele tempo escorria devagar, mas tranquilo, mais ou menos como a areia
de uma ampulheta.
Os
antigos marcavam o tempo com ampulheta. O tempo que levava para que aquela
quantidade de areia passasse da bola de cima para a de baixo, era a duração de
um exame oral nas faculdades; depois passou para a vida de família. Ainda não
havia relógio, e a ampulheta servia para marcar o tempo.
O
relógio de parede ou o colocado num móvel faz um certo tique-taque. A areia
seca, branquinha da praia, colocada numa ampulheta de cristal, escorre sem
fazer barulho, silenciosamente. Assim corria o tempo na Rua Alagoas 350,
primeiro andar, quando só os dois estavam em casa.
Quando
moço e, portanto, com muito mais vida, eu tendia a falar alto. Os dois tinham
ouvidos ruins, eu falava alto para eles me ouvirem e a casa tomava outra vida.
O telefone começava a tocar, eram pessoas que estavam a minha procura, eu tinha
que atender, vinha gente para conversar comigo, a casa se movimentava. Quando
eu saía era como se a vida parasse, e uma ampulheta silenciosa fosse a única
coisa a marcar o tempo que transcorria. Por que isso era assim? Eles se
respeitavam. Então, compreendamos bem que onde as pessoas se respeitam tudo
entra nos eixos.
Plinio
Correa de Oliveira – Extraído de
conferência de 24/9/1994
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