Continuação do post anterior
Mais ela mesma quando rezava
Aliás, cumpre
dizê-lo, por mais que eu a analisasse em todas as posições e atitudes, nunca a
achava ser tão ela mesma do que quando recitava suas orações. Sobretudo as que
ela fazia junto às imagens do Sagrado Coração de Jesus, fosse a do oratório que
tinha em seu quarto, fosse a do salão de nossa residência.
Nessas horas,
tocava-me a impressão de que as qualidades de mamãe cresciam, e que se
estabelecia — não me refiro a visões, revelações nem a quaisquer outras
manifestações de caráter extraordinário — uma espécie de vínculo entre o
Sagrado Coração de Jesus e ela, uma forma de relacionamento por onde se
percebia que Nosso Senhor comunicava algo de sua bondade infinita à alma dela.
Como fruto daquela entranhada devoção de Dona Lucilia a Ele, algo das inefáveis
qualidades do Coração Sagrado de Jesus era-lhe transmitido, cumulavam-na, e
determinava uma particular consonância entre ela e os princípios da fé
católica.
Sob as vistas de um “inquisidor” afetuoso e inflexível
Nesse sentido, devo
acrescentar outra consideração. Apesar de toda a minha benquerença para com
ela, à medida que ficava mais velho e pelo natural desenvolvimento do meu
espírito, compreendia perfeitamente que mamãe podia significar uma alta coisa
na minha vida, porém não era a norma que ditava o meu existir. O que pautava
minha existência era a Santa Igreja Católica Apostólica Romana, como passei a
conhecê-la e a amá-la, à luz dos ensinamentos dos padres jesuítas em cujo
colégio eu estudava. Estes me fizeram compreender a importância do papado, a
devoção ao Vigário de Cristo, a Nossa Senhora, à Sagrada Eucaristia, etc., bem
como chamavam nossa atenção para as tramas e os ataques que os adversários da
Igreja urdiam contra ela.
Eu via, portanto,
dois valores distintos. Primeiro, a Igreja, fonte da verdade; segundo, a
Revolução, cuja ignomínia essencial era seu ódio mortal à Igreja. Por outro
lado, eu considerava Dona Lucilia. E fiz essa comparação: “Aqui está minha mãe;
aqui, a Santa Igreja como a conheço hoje, como me é apresentada pelos meus
professores jesuítas. Em última análise, quem vale mais: a Igreja ou mamãe?”
A resposta veio
incontinenti ao meu espírito: “As coisas não se dissociam. Tudo quanto há de
bom em mamãe, ela recebeu da Igreja. Esta é o supremo bem, e mamãe só será
realmente boa, se em tudo estiver de acordo com ela.
“Agora as qualidades
de Dona Lucilia estão sujeitas ao crivo da minha análise como católico, e devo
me perguntar se tudo nela é conforme à Igreja. Pois se algo não o for, eu
prefiro a Igreja, fundada por Deus, a ela, uma criatura humana falível como
qualquer outra. Portanto, cuidado.”
E, por assim dizer,
reexaminei-a, ponto por ponto. Fazia-lhe perguntas de cunho doutrinário, para
ver bem como ela pensava. Fui seu “inquisidor”, afetuoso, respeitoso, meticuloso,
inflexível. Ela passou no exame com nota 100...
Plinio
Correa de Oliveira – Extraído de conferências em 24/4/1982 e 12/8/1988
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