terça-feira, 1 de março de 2016

Dores incompreendidas, mas nobremente aceitas (final)

Continuação dos posts anteriores
As almas desabrocham na dor
A personalidade dela era natural e legitimamente construída para um âmbito que, ao longo dos dias e das dores, devia se abrir. E somente dores muito sérias e nobremente aceitas, com o olhar posto na cruz, iriam abrindo aquele âmbito, mas abrindo dolorosamente.
Dir-se-ia que a Providência quis reservar o espetáculo de um desabrochar. Era normal que tivéssemos, portanto, um horizonte que se fosse abrindo.
A abertura na dor... Isso daria para falar nem sei quantas coisas; pretendo dizê-las no momento oportuno porque está chegando a hora de insistir a respeito do papel do sofrimento e da suprema beleza da luta na vida, etc., de se valorizar essa noção em toda a sua perspectiva.
O próprio de uma alma é desabrochar na dor e, para esse tipo de alma, o sofrer gradualmente é um sofrer dolorido. E quando há união de almas assim, muitas vezes elas maturam ora na alegria e na afinidade, ora na dor.
Não quero dizer que nos contatos de mamãe comigo não tenham, às vezes, surgido perplexidades e dificuldades, porque acho que ela tomou toda a sua abertura mais ou menos no fim da vida.
Quanto mais ela me quisesse, mais minha ausência devia fazê-la sofrer. Ela estava no direito de pensar, normalmente: “Ou sou eu a mãe tão vazia que não comove meu filho, ou ele é um filho de pedra. Que equívoco existe entre nós?” E eu saía para fazer uma reunião onde alguns não aproveitavam o que eu lhes oferecia. Eu a deixava sozinha e ia cumprir o meu dever.
Quantos equívocos assim pode haver? E tanto mais doloridos quanto mais íntimos! Todos sabem que um grão de areia entre o globo ocular e a pálpebra deixa um homem louco, por causa da íntima adesão entre a pálpebra e o globo ocular. Entre mãe e filho, nessas condições, isso é como um grão de areia...
Isto fica dito apenas de passagem para entenderem bem que não é um processo pacífico, como o desabrochar de uma flor, mas que as almas desabrocham crucificando-se.
Creio que aquilo que ela não compreendeu em vida fê-la acumular reservas de afeto, de solicitude, as quais ficaram como uma espécie de tesouro para post mortem. E hoje ela compreende.
Vendo como mamãe trata os aqui presentes, eu me lembro de como ela tratava a mim. Tenho a impressão, às vezes, de que estiveram há minutos com ela, conversaram um pouco, mas saíram impregnados da presença dela; um certo bom trato grave, sério, suave, enormemente condescendente, abarcativo, que diz uma palavra e passa e é o suficiente para um dia, mas cria uma vontade de voltar.
Toda graça, de que o “Quadrinho” ou a sepultura dela possa ser ocasião, diz “até daqui a pouco” ou, “até amanhã”; nunca corre a cortina, bem à maneira dela.
Plinio Correa de Oliveira – Extraído de conferência de 16/5/1981

1) Município localizado na região centro-leste do Estado de São Paulo. 2) Os pais de Santa Teresinha do Menino Jesus, Luís Martin e Zélia Guérin, foram beatificados em 31 de outubro de 2008. 3) Termo utilizado em Filosofia, significando matriz, padrão. 4) Quadro a óleo, que muito agradou a Dr. Plinio, pintado por um de seus discípulos, com base nas últimas fotografias de Dona Lucília. 

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