sábado, 19 de outubro de 2013

Rezando pela alma de um generoso amigo

A casa na Ilhabela, deixada pelo amigo 
José Gustavo de Souza Queirós
Era José Gustavo membro dedicado do “Grupo do Legionário”. Tratava-se daquele amigo íntimo de Dr. Plinio que, em 1937, a bordo do navio Neptunia, a caminho da Europa, oferecendo generosamente o sacrifício de sua vida pelas batalhas de Dr. Plinio em prol da Santa Igreja. Em seu testamento, deixou aos companheiros de luta alguns terrenos na ilha de São Sebastião, que foram trocados pelo sétimo andar de um edifício na rua Vieira de Carvalho. Mais tarde seu pai, Antoni de Souza Queiroz, doaria aos mesmos amigos o sexto andar desse prédio onde Dr. Plinio instalará, em 1948, a nova sede de seu grupo. Dada a boa localização do imóvel, quase no centro de São Paulo, Dr. Plinio alugou para sua própria moradia o quarto andar, para onde se mudou com seus pais. Aí Dª Lucilia viveria por seis anos, dos quais seu filho guardou sempre inesquecíveis recordações.
As providências referentes aos terrenos deixados por seu amigo levaram Dr. Plinio, em junho de 1946, à ilha de São Sebastião. De Ilhabela escreveu a Dª Lucilia, explicando- lhe o motivo de sua demora ali:
Manguinha do coração,
Como a Sra. saberá por Adolphinho, minha estadia aqui se prolonga por motivos bem justos. Tivemos delongas na assinatura da escritura, porque foi preciso pôr em ordem papéis que o nosso José Gustavo deixara algum tanto embrulhados. Mesmo depois de ter sido assinada a escritura, ainda ficaram questões a serem reguladas com a Marinha Nacional, para o que apenas ontem conseguimos dar os passos convenientes. Ainda assim, não ficou tudo elucidado. Com efeito, apareceu agora a possibilidade de serem as terras do José Gustavo consideravelmente mais extensas do que nos disse o Antoni e está muito difícil de tirar a limpo a questão. Penso mesmo que não o conseguiremos. Por fim, é preciso que nos inteiremos com vagar das condições de aproveitabilidade do local, preços por que podemos vender as tais casas, etc., etc. Em uma palavra, trata-se da traslação de um patrimônio não pequeno, aplicado em imóveis diferentes, e exigindo cuidado e atenção.
Aqui tudo se faz devagar: ninguém tem pressa, preciso esperar por todos. Assim, tenho aproveitado para descansar muito, o que tenho verificado ser muito mais necessário do que eu supunha. Descansando, é que verifiquei o quanto eu estava cansado. O clima aqui é excelente, panoramas lindíssimos, convento altamente pitoresco e interessante, passadio bem sofrível, companhia excelente. Tudo, enfim, concorre para me tornar a estadia aqui a mais proveitosa e atraente que se possa desejar. Falta-me alguém, em quem penso muitas vezes, sempre que vejo um bonito panorama, uma bonita flor, algum objeto bem artístico. Preciso dizer que é a Manguinha do meu coração?
Como vai a Sra., meu amor? O fígado se comporta bem? E os resfriados? E o coração.... muito cheio de saudades? Suponho que, às vezes, quando a Sra. está só, surpreende-se a dizer “oooh Pliiiinio!”
Minha volta está condicionada às noticias que receba do corretor. De qualquer maneira, segunda-feira eu devo estar aí impreterivelmente.
Bem, meu amor, mil abraços, mil beijos, todos os agrados, agradões (às vezes um pouco rústicos) e agradinhos possíveis, do filho que lhe quer imensamente e lhe pede a bênção.
Plinio
Na resposta a essa carta, Dª Lucilia se mostrava resignada com a demora do regresso de seu filho a São Paulo, pois sabia estar ele aproveitando para descansar um pouco. E não seria ela mesma se não lembrasse a Dr. Plinio de rezar pelo eterno descanso do saudoso José Gustavo, cuja morte prematura tanto a penalizara.
S. Paulo, 26-6-946
Plinion querido!
Quando vi o Adolphinho entrar só, fiquei deveras desapontada, pois as saudades são muitas, mas, refletindo bem, estimei que tivesses ficado. Precisas realmente de um bom repouso com mais freqüência, para não chegares ao estado de cansaço em que te achas. É pena que este novo “El Dorado” (...) seja tão distante, de tão difícil acesso, e baldo de recursos!
Vê se não fazes imprudências e se voltas mais repousado, mais forte e.... sempre querido! Acho uma falta enorme em você, mas acho preciso que te demores mais um pouco. Pelo que vejo, este negócio de S. Sebastião vai ser um dos tais intermináveis, que leva anos!
Vou tentar enviar-te pelo ônibus, umas latas de bolachas, língua e sardinhas. Coitados, que saudades de um pãozinho, mesmo de fubá, não? Estimarei que mesmo assim, aproveitem todos muito a estadia aí, recomendando-me a todos.
Imagino como devem ter todos sempre presente a memória do bom amigo José Gustavo! Rezem e comunguem por ele!
E dando a notícia de sua participação na novena ao Sagrado Coração de Jesus e na procissão de Corpus Christi, mencionada acima, Dª Lucilia encerrava mais uma de suas cartas ao “filhão querido”, repassada de carinho e saudades.
Transcrito, com adaptações, da obra “Dona Lucilia”, de Mons. João S. Clá Dias



Nenhum comentário:

Postar um comentário