sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Incólume tabernáculo interior – I

A serenidade e a segurança que tanto caracterizavam Dona Lucilia, e que ela difundia tão prodigamente em torno de si, vinham-lhe de um tabernáculo interior que os vagalhões da vida não conseguiram atingir.
Quando alguém recebe um toque da graça vinda do Céu e sente uma espécie de glória que o cerca, o ilumina, é envolvido de uma tranquilidade, uma serenidade esplêndida, uma segurança magnífica e de um gáudio em que não entra em jogo a vidinha de todos os dias, nem o “vidão” do dia da glória. É uma espécie de participação da honra que Deus fará ao indivíduo quando ele entrar no Céu, que é uma coisa única!
Em todo homem há duas histórias: a interna e a externa
Todos nós, mais ou menos, tivemos ocasião, numa circunstância ou noutra da vida, de experimentar uma consolação especial na qual, entre outras coisas, sentimos todo o nosso ser honrado, dignificado e elevado por esse contato com Deus. Perto disso, todas as glórias terrestres de fato não são nada, não valem nada, não contam para nada. Em geral, as pessoas com verdadeira vida interior têm em relação a esta vida terrena uma posição assim: elas podem dizer que a vida não vale nada, em certo sentido; vanitas vanitatum et omnia vanitas1, ou “tudo é vaidade e aflição do espírito”2 — expressões lindíssimas, aliás!
Entretanto, em outro sentido, não é tanto assim. Por exemplo, Jó recebeu um prêmio na Terra que foi o de ter muito mais depois da prova, do que a enormidade que ele recebera antes dela. Ademais, viveu muitos anos e — coisa muito pouco moderna e por isso mesmo muito verdadeira e bela — teve uma grande quantidade de filhos. Após perder todos os filhos, ter uma grande quantidade de filhos era ainda uma grande glória.
Esta vida, portanto, tem o seu valor, e o verdadeiro católico compreende esse valor.
Mas há duas coisas que se fundem e estão por cima disso. Uma é a história externa do indivíduo: aconteceu isso, fez aquilo, etc. Outra é a história interna: aquilo por onde ele passou de grande, de pequeno, de glorioso, de insignificante, toda a história de sua alma, com as cicatrizes que o sofrimento deixou nela, e que preparam esta pergunta: Em função do meu passado, como será o meu futuro, e como terminará para mim esta vida?

É uma indagação muito importante e que o homem cozinha sozinho consigo, porque ela é incomunicável. É tão íntima, tão interna, que eu acho que a maior parte das pessoas nem saberia como dizer para outro o que leva dentro de sua mente. 
Continua...

Nenhum comentário:

Postar um comentário