terça-feira, 24 de novembro de 2015

A devoção de Dona Lucilia ao Sagrado Coração de Jesus

As imagens de Nosso Senhor, junto às quais Dona Lucilia rezava constantemente, tinham como modelo o Santo Sudário de Turim. Eram profundamente sérias, tristes, plenas de grandeza e, no olhar, exprimiam a imensidade do amor do Redentor para com os homens. A piedade dela se exercia em função de Nosso Senhor visto dessa forma.
Plinio Correa de Oliveira explica qual era a noção, a ideia, que sua mãe tinha a respeito do Sagrado Coração de Jesus, e o que Este representou para ela.
O Santo Sudário, padrão perfeito das imagens do Sagrado Coração de Jesus
No tempo de Pio IX, a Igreja chegou a ter um movimento bem desenvolvido no que diz respeito à devoção ao Sagrado Coração de Jesus. Esse movimento continuou em algo na época de Leão XIII, e depois reviveu ainda mais no tempo de São Pio X.
Essa devoção era incrementada, sobretudo, pelo Apostolado da Oração, grande organização dos padres jesuítas, que abarcava o mundo inteiro. E a ideia que o Apostolado da Oração apresentava do Sagrado Coração de Jesus era expressa, até certo ponto, pelas estampas e imagens daquele tempo, as quais naturalmente tinham diferenças fisionômicas — porque não há um modelo oficial, e cada artista concebe a figura de Jesus mais ou menos como entende. Mas as imagens de Nosso Senhor do século XVIII e épocas anteriores são menos parecidas com as do final do século XIX, que tomaram como modelo o Santo Sudário, o padrão ideal, perfeito, objetivo.
Estas últimas eram inteiramente coerentes com o que seria Nosso Senhor gladífero1. Quer dizer, um homem em luta contínua contra o mal, nas suas horas de bondade, seria bondoso sem diminuir o seu espírito combativo; e um homem verdadeiramente afável, nas horas de luta seria gladífero. De maneira que, embora não apresentassem diretamente Jesus enquanto gladífero, as imagens davam, por assim dizer, uma pista de voo para se chegar até o gladífero.
Recusa à mentalidade do século XX
Dona Lucilia formou seu espírito segundo essa concepção. Ela era do tempo de Santa Teresinha do Menino Jesus, portanto século XIX largamente; e morreu, graças a Deus, bastante idosa, mas quase não entrou no século XX. Vamos dizer que o século XX, depois de aproximadamente 1930, ela não acompanhou; e antes disso ela entrou para recusar. É claro que o fato de ela não ter acompanhado, após 1930, é uma forma de recusa também.
Dessa forma, sendo Nosso Senhor bem simbolizado, mamãe tinha uma boa ideia d’Ele. E a imagem que está no oratório dela exprime adequadamente o que o conjunto das imagens católicas, no fluxo da devoção ao Sagrado Coração de Jesus no século XIX, apresentava. Dona Lucilia tinha grande devoção por aquela imagem; e também pela que está no salão azul 2, feita de alabastro, a qual é inteiramente da escola da imagem que se encontra no oratório de mamãe. Então a ideia de Nosso Senhor era representada por essas imagens, muito parecidas com o Santo Sudário.
Imagens sérias, repletas de doçura
Essas imagens apresentam Nosso Senhor enormemente sério, enormemente triste e enormemente grande. A atitude do Redentor é de uma seriedade triste, perto da qual o pecador se sente pequenino. E Ele imenso, não pela estatura física, mas pelo porte moral, perto do qual qualquer um se sentiria pequeno. Porte moral feito de altíssimas cogitações. Realmente Ele era uma só Pessoa, mas na qual havia União Hipostática 3, e as imagens representam a humanidade d’Ele. Quais são as cogitações de uma natureza humana que está em União Hipostática com Deus?!
Quer dizer, todos os místicos que houve — há e haverá — não tiveram uma união com Deus parecida com a União Hipostática. Acrescentemos a isso a santidade perfeita da humanidade d’Ele, e compreendemos que é insondável a grandeza de sua humanidade; e na humanidade d’Ele não se vê só humanidade, mas também a divindade, que transparece por causa da União Hipostática.
Então a grandeza de Nosso Senhor é uma grandeza muito triste. Em geral as imagens desse tempo são sérias, de um olhar doce, mas que envolve e penetra na pessoa. E há uma pergunta implícita n’Aquele que olha para o pecador com bondade, com afeto, para uma criatura, mais ainda para um filho: “Mas, em troca de tão pouco você fez tudo isto pelo qual Eu estou sofrendo? Veja bem, você fez e Eu o amo, até o perdoo, mas quero que você pense!”

Existe uma censura dentro disso. Não uma censura gladífera e iracunda, mas nobremente interrogativa, que pergunta, no fundo, o seguinte: “Será que você levará a sua torpeza e sua maldade a tal ponto que, vendo-Me nessa doçura e nessa atitude de perdão, você ainda continua endurecido?”
Continua no próximo post
1) Cf. Ap 1, 16. 
2) Sala de visitas do apartamento de Dona Lucilia. 
3) Termo utilizado na Teologia para indicar, em Cristo, a união das duas naturezas – divina e humana – na Pessoa do Verbo. 

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