Na derradeira etapa de sua viagem pela
Europa em 1952, Dr. Plinio deixou a França em direção à Inglaterra, tão querida
de Dª Lucilia, onde se encantou com a famosa Casa do Parlamento — vasto
edifício em estilo neo-gótico, construído no século passado de acordo com o
projeto de um arquiteto católico — cujas torres se refletem belamente no
Tâmisa.
Partindo do Reino Unido em 29 de
agosto, Dr. Plinio passou rapidamente por Paris, e no dia 30 desembarcava no
avoengo Portugal, não menos amado de Dª Lucilia. Neste último país, ao visitar
a histórica e célebre cidade de Coimbra, esteve com a Irmã Lúcia, a quem Nossa
Senhora aparecera em Fátima.
Finalmente, uma fotografia dele, tirada
no aeroporto de Madri, trazia no verso expressivas palavras, e prenunciava seu
breve regresso a São Paulo, dando a Dª Lucilia um antegozo do reatamento do
convívio com seu filho.
Lú,
querida minha
Antes
de descer no Pernambuco tão caro ao Dr. João Paulo, envio-lhe um milhão de
beijos, e a ele muitos abraços. E, para consolar a Senhora destes dias de
atraso em minha chegada, aí vai esta fotografia que tirei no aeroporto de
Madrid, vindo de Lisboa. Beijos e beijos a Rosée e Maria Alice, e abraços para
as tias, Antônio, Eduardo.
Espero
que meu banquete de chegada esteja à altura da viagem que foi ótima, e a
respeito da qual muito terei que lhe dizer. Pede sua bênção com o carinho e
respeito de sempre,
Plinio
Visita aos parentes pernambucanos
Certa manhã, nos primeiros dias de
setembro, Dª Lucilia, radiante, pôde abraçar e beijar seu “pigeon” querido, não
só “espiritualmente”, mas de verdade. Agora sim, para ela a casa tomava vida,
pois o “dono e senhor” chegara. Que alegria pensar na possibilidade de, talvez
naquela mesma noite, ser restaurada a “prosinha”. Três meses de viagens de seu
“filhão” pela Europa, em contato com pessoas de origem e mentalidade tão
diferentes, prometiam temas para longas e entretidas conversas, se bem que
ainda mais atraente fosse a presença dele.
Seguindo a sugestão de seu pai, Dr.
Plinio de fato interrompera sua viagem, descendo em Pernambuco, a fim de estar
com os Corrêa de Oliveira. Dª Lucilia se interessou desde logo por saber como
estava a família de seu esposo, a qual conhecera após o casamento, havia mais
de 40 anos. Teria conservado o Engenho Uruaé sua antiga aparência? Estaria tudo
como antigamente, a capela, a casa, os móveis, e até mesmo os vestígios das
construções de épocas passadas? Quiçá ruínas a recordar o tempo em que os
ancestrais da família haviam desbravado aquelas vastidões?
O tio de Dr. Plinio, Antônio Corrêa de
Oliveira — morgado da família — recebeu seu sobrinho com toda a solicitude. Era
um homem imponente, que encarnava as melhores tradições do Brasil Imperial. Na
fazenda, trajava-se da maneira mais despretensiosa possível, à moda do
Nordeste: uma simples roupa de linho branco, que lhe realçava o ar senhorial.
Fiéis aos antigos costumes, serviram ao
visitante um lauto e magnífico almoço, bem animado por agradável prosa.
Terminada a refeição, todos passaram ao terraço onde o senhor-de-engenho se
deitou na rede — só ele — enquanto os outros se sentavam por perto em cômodas cadeiras,
prolongando a conversa. Contemplando seus domínios como um pequeno soberano,
com uma vara ele fazia vagarosamente balançar a rede para lá e para cá.
Dr. Plinio guardou também grata
lembrança do almoço que lhe ofereceram sua prima Luzia — filha do tio Antônio —
e o esposo, Nelson Rabello, em sua residência de Recife. A prole do casal era
simpática e numerosa. Porém, a atenção de Dr. Plinio voltou-se mais
especialmente para sua tia e madrinha, Teresa, solteira, residente em Goiana e
pessoa de uma piedade ardente e modelar.
Depois dessa breve escala na terra de
seus ancestrais nordestinos, Dr. Plinio finalmente embarcou para o almejado
reencontro com sua querida mãe, em São Paulo.
Requinte de qualidades
São inúmeras as recordações do
abençoado convívio de Dª Lucilia com seu filho e com outras pessoas, nos
últimos anos de vida dessa inesquecível dama paulista. Seria nesse período,
durante o qual se entregaria de modo especial à oração e à reflexão, que ela
mais requintaria suas virtudes, tal como uma rosa cuja fragrância é melhor
sentida ao ser destacada da roseira e colocada numa bela jarra de cristal, para
servir de adorno num salão.
Assim, no convívio com Dª Lucilia, a
afabilidade não fez senão acrisolar-se no volver dos tempos. Sua elevação de
espírito se foi tornando cada vez mais penetrada pelo sobrenatural, suas
maneiras e sua presença passaram a ser, em grau ainda maior, atraentes fatores
de bem-estar e de respeitabilidade.
Imbuída de profunda confiança na
infinita bondade do Sagrado Coração de Jesus, Dª Lucilia continuará a dar
alento a todos os que dela se aproximarem necessitados de consolação, aplicando
com eficácia o lenitivo da caridade cristã.
Se a essa altura Dª Lucilia tivesse
entregado a alma a Deus, bela já teria sido sua existência. Entretanto, ao
longo do último período de sua vida, no recolhido ambiente de sua residência na
Rua Alagoas, ela externará de forma mais alcandorada a plenitude de seu afeto e
benquerença.
O apartamento se conserva hoje tal qual
era, primorosamente montado pelo bom gosto e pelo amor filial de Dª Rosée e de
Dr. Plinio. Suas paredes e os objetos que ali estão muito teriam a narrar, se
tivessem o dom da palavra. Sobremaneira interessante seria poder ouvir o que a
imagem do Sagrado Coração de Jesus teria a contar sobre as inúmeras orações de
Dª Lucilia. Nunca se soube o que ela tratava com Nosso Senhor naqueles
silenciosos diálogos. Nem a seu filho chegou ela a confidenciar algo a tal
respeito.
Entretanto, se essa piedosa intimidade
permaneceu num inviolável sigilo, alguns pequenos fatos da vida serena e
caseira de Dª Lucilia ultrapassaram as paredes desse abençoado lar.
Transcrito, com adaptações,
da obra “Dona Lucilia”, de Mons. João S. Clá Dias
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