Com o correr dos anos acentuava-se a soledade de Dª
Lucilia. Aos poucos as pessoas de seu tempo iam sendo levadas pela
voragem da vida. Como ela continuasse sempre igual a si mesma, um
distanciamento inevitável se estabelecia em relação às gerações
que iam surgindo: tinham estas os olhos voltados para a modernidade;
ela colocara os seus na eternidade.
Além disso, uma progressiva dificuldade de audição
foi contribuindo para aumentar seu isolamento. Mas sua inteira
conformidade com a vontade de Deus a ajudava a suportar
resignadamente esses sofrimentos.
“O seu relógio é o Plinio!”
Um conforto lhe ficava, e não pequeno. Era o crescente
afeto de seus filhos, que assim procuravam aliviarlhe o peso da cruz.
Dª Lucilia retribuía empregando todo o seu tempo, não só para
“aconselhar e aperfeiçoar”, mas para rezar cada vez mais por
eles.
Certa feita, quando a família acabava de almoçar,
chegou Dª Yayá, uma das irmãs dela. Ao entrar, disse num tom de
muita intimidade:
— Como é? Vocês ainda estão almoçando?! Eu já
acabei de almoçar há muito tempo!
Dona Lucilia tomava as
refeições mais tarde, para acompanhar Dr. Plinio, pois ele seguia
horários que não eram os do comum das pessoas. Por isso, Dª Yayá
logo acrescentou:
— Lucilia, você
podia pegar os relógios que há nesta casa e guardálos todos.
— Mas, por que isso, Yayá? — indagou calmamente Dª
Lucilia.
— Porque o seu relógio é o Plinio. O tempo inteiro
você toma como ponto de referência os horários dele: é a hora de
Plinio se levantar, a hora de Plinio sair, a hora de Plinio voltar, a
hora de Plinio almoçar... De maneira que relógio para você não
vale nada!
O comentário de sua irmã correspondia à realidade, em
boa medida, pelo que Dª Lucilia o tomou com inteira naturalidade,
respondendo apenas com um sorriso afável, como quem diz: “É isso
mesmo...”
Para tal mãe, que levava a estima por seu filho a ponto
de regular seu horário pelo dele, muito custou um período durante o
qual ele teve de se ausentar inúmeras noites seguidas.
Continua no próximo post
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